Campo de Concentração de Sachsenhausen – triste memória para que nunca mais se repita.

Quando decidi ir para a Alemanha e defini que iria para Berlim, comecei a procurar a existência de algum campo de concentração que fosse nas rendondezas. Não precisei nem procurar muito: Sachsenhausen fica em Oranienburg, uma cidadezinha pequena, próxima de Berlim…

Senta que lá vem a história.

Ir para Berlim é estar sempre se confrontando com duas coisas: Guerra Fria e Segunda Guerra Mundial. Ambas bastante desagradáveis, porém necessárias para que o mundo fosse o que é. Visitar um campo de concentração não é turismo mórbido e nem contemplação da dor. É tornar público tudo o que aconteceu para que nunca nos esqueçamos. E para que os próprios neo nazistas (que sempre surgem em momentos de crise e falta de dinheiro) saibam muito bem a bandeira que estão levantando…

Para chegar em Oranienburg deve se tomar o S1 (Wannsee – Oranienburg). Leva uns quarenta minutos e pega a região C do transporte coletivo de Berlim. Ou seja, um passe diário comum, que cubra as regiões ABC já te leva prá lá. Da estação de trem até o que foi o campo de concentração são uns 3 km (20 minutos de caminhada). É factível, pois a cidade é muito bonitinha, um típico vilarejo alemão. Para quem não quiser o camelo, os ônibus 804 (em direcção a “Malz”) ou a linha de ônibus 821 (em direção a “Tiergarten”) levam ao memorial Sachsenhausen. O bilhete custa aproximadamente 1,40€. Na volta, fique esperto para o horário dos ônibus, porque eles só passam de hora em hora. Quando saímos, ele tinha acabado de passar, então decidimos ir à pé até a estação. Foi uma agradável caminhada, mas é um pouco distante.

Na estação de trem já existem placas sobre o que ocorreu. Os judeus aprisionados tinham que caminhar o trecho entre a estação e o campo. A região, no verão, já é fria. Imaginem no inverno. Some-se a isso o fato da própria população, instigada pelos nazistas, atirar paus, pedras e agredir fisicamente alguns dos judeus que eram, segundo a propaganda oficial, culpados pelas mazelas a que o povo alemão estava submetido.

Na entrada do memorial, existe um grande muro, com os escritos:

Atrás desse muro existe um trecho que se deve caminhar, até o portão do antigo campo.

Grades…

E um muro ladeando o corredor até a entrada.

Chegando na entrada, temos o prédio e o portão, com os dizeres “O trabalho liberta”.

Dali prá dentro é que o bicho pega. Estava muito frio em plena primavera/verão. Lembrei daquele filme “O menino do pijama listrado” e das roupas que os judeus usavam. Era muito cruel aquilo no verão. No inverno, então…

O campo tinha uma série de barracas. Disseram que umas 200.000 pessoas passaram por lá, entre 1936 a 1945, quando os soviéticos tomaram Berlim. Desses 200.000, estima-se em 100.000 o número de mortos. As mortes foram causadas pelos mais diversos motivos, incluindo fome, frio, execuções e doenças…

Aqui uma ideia do lugar

Uma das barracas

Uma planta de como era

Dá prá ter uma ideia de que havia centenas de barracas. Hoje, de pé, existem 4. Duas são museus, com exposições sobre o campo e outras duas estão inteiras, mostrando como eles viviam. Vamos a elas?

Segundo a placa acima, naquela ala da barraca ficavam 250 pessoas. Cada barraca, bem grande, era formada por duas alas. Os banheiros/latrinas (se é que se pode chamar aquilo de banheiros) ficavam no meio. De manhã, quando havia o toque de despertar, todos tinham que correr para se limparem e fazerem as suas necessidades o mais rapidamente possível, pois quem se atrasasse sofria punições. Os banheiros são todos abertos, sem a menor privacidade, como se fossem animais… As beliches ficavam o mais próximo possível umas das outras para caber mais gente. Em tempos de muita população, há relatos de que as pessoas dividiam camas…

Os refeitórios ficavam na entrada dos quartos, junto com os armários. As mesas grandes, acomodavam os prisioneiros daquela barraca.

Cada barraca tinha um responsável, que se reportava para o guarda. Tudo era muito vigiado e restrito. Os judeus, durante o dia, não podiam se dirigir às barracas sem autorização. A utilização dos “banheiros” era limitada a de manhã e à noite, ou quando autorizado pelos guardas…

As barracas eram de madeira, mas tinham calefação. Se não fosse assim, não teria ninguém sobrevivido àquilo…

Andando pelo campo, nota-se o rigor da vigilância. Ele tinha a forma de um triângulo e havia diversas torres de observação. As informações que foram passadas são de que aqueles que tentassem fugir eram alvejados para serem mortos…

Quem chegasse até a chamada “zona neutra”seria alvo de tiros.

Há relatos de que, muitas vezes, os próprios guardas, por diversão, atiravam nos judeus. Nesses casos, havia algumas punições, já que esse tipo de conduta poderia levar à uma rebelião…

Andando pelo local, chegamos nesta casa. Ela fica no final do campo e disseram que era usada para duas coisas. Uma delas era o “hospital”  e outra o IML do lugar, onde se tratavam eventuais doenças e verificava-se do que os judeus haviam morrido… Dizem que aqui foram feitas experiências em humanos, como se sabe que o Hitler fez…

Ainda dentro daquela casa hospital/IML ficava um outro lugar que nos deixou com dúvidas. Ali, naquele campo, foi usada a câmara de gás. Disseram que ficava na Estação Z, que era atrás dessa casa. Mas esse cômodo abaixo nos pareceu muito com uma…

Essa sala, talvez seja essa câmara de gás. Vai saber…

Seguindo em frente dessa casa, vamos para a estação Z propriamente dita. Essa foto abaixo mostra o local de execução, a tiros, que foi construído ali.

Notem que era todo fechado, dos dois lados, para evitar fugas. E o paredão até certo ponto pequeno. A história conta que no dia da abertura, para “comemorar” a inauguração, 96 judeus foram fuzilados ali.

Essa daqui é a entrada para a Estação Z. Atrás desse lugar foi feito o crematório, para se livrar dos corpos dos assassinados…

E isso é o que sobrou dela. Os soviéticos meteram bala nisso aqui tudo, para acabar…

O nome estação Z foi uma piada de mau gosto dos nazistas, já que a entrada do campo era a Estação A, vivos, e a Z, a saída, mortos.

Ainda não acabou…

Esse campo, como disse acima, não tinha o objetivo primário de ser de extermínio. Com o andamento da guerra e a necessidade de lugares para colocar os prisioneiros, ele foi se tornando. Por isso, havia uma prisão lá dentro, onde presos políticos e opositores do nazismo também eram trancados.

Prédio da cadeia

Entrada

E a solitária

Bem no centro do campo, há um monumento feito aos mortos ali…

E uma vista do portão de entrada, em foto tirada no monumento

Terminamos o passeio por esse jardim, onde ficava a casa do responsável pelo local. Havia um bosque e um riozinho lá na parte debaixo da casa. Incrível como o cara podia ter estômago de morar tão perto do inferno…

O bosque

Este campo, além de todos os horrores vistos, era um lugar onde os nazistas produziam cédulas de dinheiro e de crédito de bancos ingleses e americanos, além de moedas. Com o avançar da guerra e a necessidade de dinheiro, os nazistas cunhavam eles mesmos dinheiro para tentar causar um colpaso no sistema monetário dos aliados. Nunca foram encontrados os que fizeram isso, mas há máquinas desse tipo no museu, que não permite fotos..

Bom, e o que aconteceu com o campo após a guerra, podem se perguntar?

Antes da capitulação de Berlim, os alemães deram início a um plano para evacuar o campo. Conhecido como marcha da morte, obrigou os prisioneiros, fracos e desnutridos, a caminharem até o noroeste, em fuga. Os que não resistiam e caíam eram assassinados a tiros pelas SS. Um horror sem tamanho.

Os soviéticos, mesmo com muitos protestos de judeus, usaravam o lugar como prisão até 1950. Ali ficaram nazistas, anti comunistas, espiões e etc. Em 1950 o campo foi fechado. Em 1956 os alemães orientais criaram o memorial, inaugurado em 1961. Após a decada de 1990, com a reunificação, o campo foi liberado e descobriram alguns horrores feitos pelos soviéticos no período. Há um outro memorial, com casas separadas, em um terreno anexo, usado pelos soviéticos para aprisionar os adversários políticos, além de valas comuns, onde o pessoal do Stálin jogou muitos corpos…

O passeio, apesar de parecer pesado, não é. Não é o turismo mais animado do mundo, é claro, mas é preciso que as pessoas conheçam para que novas barbáries como essa sejam evitadas no futuro. Muitos grupos fazem visitas até o campo, que não cobra entrada…